Pr. João Soares da Fonseca
Não Era Para Ter Saído no Jornal
O jornalista Artur Xexéo contou, em sua crônica dominical, uma piada, frequente em redações de jornal.
Era uma vez um jovem repórter, enviado pela redação a cobrir a inauguração de um circo. Seria a sua primeira reportagem. Mas quando chegou ao local, viu que o circo estava em chamas: o fogo “consumia a lona já armada, ameaçava os animais, deixava os artistas desesperados”. Desapontado, o jovem repórter retornou à redação, argumentando que infelizmente não houve inauguração nenhuma e que, portanto, não haveria matéria a ser publicada. Conclui o articulista: “Não percebeu que o incêndio era uma notícia mais importante ainda.” (“À dinamarquesa”, O Globo, 02-05-2020).
A percepção do que é e do que não é notícia parece ser o diferencial entre o bom e o mau jornalista.
Estou dizendo isso porque quero lhes contar algo que não deveria ter sido notícia e acabou sendo. Aconteceu no início da pandemia, e a história saiu publicada no jornal A Gazeta, de Vitória (ES), que é, há décadas, o maior jornal do Estado do Espírito Santo.
Na cidade de Nova Venécia, o senhor Luiz Bevitori, 77 anos, tem uma pequena loja de produtos artesanais no Mercado Municipal. Um dia, ele notou que um cliente havia esquecido no balcão um envelope com dinheiro. Saiu correndo para a rua pra ver se encontrava o cliente, mas não conseguiu. Seu Luiz não abriu o envelope, mas o guardou e anotou os principais traços físicos do último cliente.
Dois meses depois, um homem parecido com os traços que anotara entrou na loja. Era o senhor Geumar Gonçalves, que mora em Pedro Canário (ES) e havia ido a Nova Venécia para matricular o filho em uma universidade local. Confirmada a identidade, recebeu de volta seu envelope. O jornal diz ainda que Seu Luiz é membro da Igreja Batista (A Gazeta, 19-07-2020). Mas não precisava dizer. Aliás, nem era pra sair no jornal. Esse comportamento é que deveria ser o normal entre nós.
